OESP, Metrópole, p. C1 - 10/09/2012
Estado vai demolir mais 7 mil casas na Serra do Mar
Maioria das intervenções, em 20 municípios da região litorânea, terá como alvo as construções no entorno do parque estadual
Adriana Ferraz
Depois de iniciar a remoção de 5.350 famílias dos bairros-cota de Cubatão, o governo do Estado vai acelerar a demolição de mais 7 mil moradias irregulares em outros 20 municípios da região litorânea. A maioria das intervenções fará parte da segunda etapa do programa de recuperação da Serra do Mar, prevista para ser lançada no fim do mês pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB). A ordem é dar prioridade a três cidades do litoral norte: São Sebastião, Ubatuba e Caraguatatuba.
Juntos, os municípios devem somar 3.392 remoções, ou 48% do total. O foco são os barracos dentro do Parque Estadual da Serra do Mar ou no seu entorno, onde a pressão por moradia é ainda maior. Na beira da Rodovia Rio-Santos, os morros já estão tomados por favelas, com vista para o mar, em um cenário semelhante ao encontrado no Rio. Mas o governo afirma que casas de alto padrão construídas em lotes de Mata Atlântica também serão demolidas.
São Sebastião e Ubatuba concentram o maior número de moradias irregulares identificadas no interior do parque. São 389 habitações nessa condição listadas para sair - a maioria nas proximidades das praias da Barra do Sahy, Juqueí, Perequê Mirim e Barra Seca. Em Caraguatatuba, o número é menor. Lá, 43 serão removidas. As demais estão na chamada zona de amortecimento (veja mapa acima).
Segundo a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), as intervenções visam a preparar a região para absorver a crescente demanda por habitação popular. A preocupação tem relação direta com o pacote de grandes obras a ser executado no litoral norte a curto prazo. A lista inclui a ampliação do Porto de São Sebastião, a duplicação da Rodovia dos Tamoios e a criação de infraestrutura necessária para a exploração do pré-sal.
"Os investimentos têm o objetivo de minimizar ou mesmo evitar novas ocupações", diz o coordenador do programa, Fernando Chucre, que calcula começar as remoções na região apenas em 2014. A previsão é gastar R$ 1 bilhão, mesmo valor calculado para a primeira etapa, ainda em andamento.
Chucre explica que o início de uma fase não depende do término da outra. Isso quer dizer que a intenção é tocar as duas etapas ao mesmo tempo, com uma diferença: o prazo para a realização das 7.086 remoções da primeira fase, financiadas pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), termina em 2014. Nem metade desse total foi cumprido.
Verticalização. A demora está relacionada, segundo o governo, à dificuldade em obter terrenos e também em cumprir as diferentes regras de zoneamento municipais. Em São Sebastião, por exemplo, é proibido construir prédios. O veto à verticalização limita os projetos à construção de casas e, consequentemente, exige terrenos maiores.
A solução defendida pelo Estado é a de criar Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis) nos municípios atingidos. A classificação abre brechas na lei para a produção de unidades habitacionais, como a liberação de prédios para este fim e também a urbanização das moradias que ficarão nas zonas protegidas. Ao todo, até 2015, 23,3 mil casas sofrerão algum tipo de intervenção na região serrana de São Paulo. Para impedir novas ocupações, após a retirada das famílias, a CDHU afirma que terá fiscalização por terra, mar e ar. "Já temos helicópteros e encomendamos lanchas e novas viaturas para a Polícia Ambiental."/ Colaborou José Maria Tomazela
Novo Jd. Botânico
Parte do programa de recuperação da Serra do Mar, o Jardim Botânico de Cubatão será construído no bairro da Água Fria, após a remoção das famílias que ali vivem.
São Sebastião está em situação crítica e deve ter prioridade
Análise: Márcia Hirota, diretora de gestão do conhecimento da Fundação SOS Mata Atlântica
O litoral norte de São Paulo tem os municípios mais preservados da Mata Atlântica, com uma beleza paisagística singular e grande vocação para o desenvolvimento aliado à conservação. Mas, infelizmente, o cenário é outro. As intervenções irregulares interferiram diretamente na conservação e acarretaram perdas florestais, da biodiversidade e também da integridade e qualidade de vida das populações.
No litoral norte, o município que realmente merece atenção especial e deve ser priorizado é São Sebastião. Atualmente, é o que se encontra em situação mais crítica, enfrenta grande pressão em seus recursos naturais e está sob forte ameaça por novos projetos e empreendimentos de alto impacto para a região.
O ideal é que esse esforço de recuperação seja feito de forma integrada, entre o governo do Estado e prefeituras, e esse programa não seja considerado como medida compensatória para os projetos que virão.
Os trabalhos devem ser realizados de forma a construir um planejamento da expansão, evitando a ampliação e ocupação em áreas inadequadas para habitação, promovendo um esforço de restauração da vegetação nativa, de saneamento ambiental e criando um processo de monitoramento e fiscalização para evitar novas invasões.
Outro esforço ainda deve ser voltado para o uso público do Parque Estadual da Serra do Mar,estimulando e fortalecendo iniciativas e atividades sustentáveis das comunidades locais, de forma a trazer o desenvolvimento regional, aliado à conservação da natureza.
Invasão atravessa pista e já concorre com condomínios
Reginaldo Pupo
Às margens da Rodovia Rio-Santos, em São Sebastião, já é possível ver conglomerados de barracos que há alguns anos estavam exclusivamente nas encostas da Serra do Mar. Hoje, algumas das habitações precárias invadiram o outro lado da pista, sentido praia, e disputam espaço com condomínios de luxo. Com elas, emaranhados de fios surgem de postes de madeira improvisados para abastecer os núcleos habitacionais da Vila Esquimó e da Vila Progresso, em Juqueí.
Situação semelhante é encontrada na Vila Baiana, em Barra do Sahy, uma das mais antigas áreas de invasão da cidade. Apesar de a prefeitura considerar os núcleos "congelados", é possível observar novas construções sendo erguidas na região.
Em São Sebastião, o projeto estadual para a remoção dessas famílias é encarado com descrédito. Mas os moradores são unânimes na decisão de resistir à remoção, uma vez que, de acordo com o projeto, eles tendem a ser remanejados para o bairro da Enseada, no limite com Caraguatatuba, a 50 quilômetros. "A prefeitura alega que não podemos permanecer porque é área de risco e de preservação, mas logo ali (aponta para Juqueí), estão construindo um condomínio de ricos e os tratores não param de derrubar árvores", alega a doméstica Marinalva Bispo, de 48 anos.
Para a camareira Zelita da Silva, de 22 anos, a distância do trabalho inviabilizaria o sustento da família. Ela saiu de Tinguá (CE) há três anos. Junto com o marido, pagou R$ 9 mil por um barraco a três passos de um córrego que recebe o esgoto produzido pela comunidade. Para chegar em casa, precisa percorrer uma ponte improvisada, às vezes carregando o filho de 1 ano e 7 meses. "Se tivermos de sair, preferimos voltar para o Ceará."
Unidades insuficientes. O secretário de Habitação de São Sebastião, Roberto Alves dos Santos, informou que estão sendo construídas 50 casas populares no bairro Enseada para absorver os moradores da Vila Esquimó. Mas reconhece que a quantidade é insuficiente, pois as invasões crescem ano a ano.
OESP, 10/09/2012, Metrópole, p. C1
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,estado-vai-demolir-mais-7-mil-casas-na-serra-do-mar-,928213,0.htm
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,invasao-atravessa-pista-e-ja-concorre-com-condominios-,928216,0.htm
UC:Parque
Unidades de Conservação relacionadas
- UC Serra do Mar (PES)
As notícias publicadas neste site são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.